Mudanças de ciclo: a educação socioemocional na transição do ano escolar

A chegada de um novo ano letivo pode trazer dificuldades aos estudantes que estavam acostumados com a antiga rotina. Esse impacto pode se refletir tanto na estabilidade emocional quanto no desempenho escolar dos alunos, especialmente quando há mudanças de ciclos acadêmicos, como na transição dos Anos Iniciais para os Anos Finais do Ensino Fundamental ou desta etapa para o Ensino Médio.

Os dados do Censo Escolar 2022, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), ilustram esse estranhamento ao novo ciclo. No período considerado, o índice de aprovação dos alunos do 5º ano foi de 97,1%, enquanto no 6º ano – início dos Anos Finais do Fundamental – caiu para 96,2%, representando uma queda de quase um ponto percentual. Já no 9º ano, esse índice foi de 96,1%, diminuindo para 91,1% na 1ª série do Ensino Médio.

Mudanças de ciclo e saúde socioemocional dos alunos

Fabiana Pereira, assessora pedagógica do Líder em Mim, explica que tudo o que é desconhecido geralmente carrega um peso de desconforto, medo e ansiedade. No ambiente escolar, esses sentimentos são potencializados frente às pressões acadêmicas e sociais.

“Quando as mudanças dizem respeito a apenas avançar no ano letivo, em algumas séries, o nível de ansiedade geralmente é menor”, diz ela. “Já quando temos as trocas de ciclo, da Educação Infantil ao Ensino Fundamental, do 5° para o 6° ano ou do 9° ao Ensino Médio, o nível mais elevado de ansiedade e estresse muitas vezes está ligado ao medo da mudança e do desconhecido.”

A especialista aponta alguns motivos que colaboram para a desestabilização emocional dos estudantes:

  • Incerteza sobre a turma do ano seguinte: Nesses momentos de mudança de ciclo, é comum muitos pais decidirem trocar os filhos de escola, para evitar interromper as etapas acadêmicas antes de fechar um ciclo. Além disso, também acontece de os próprios gestores ou coordenadores da escola alterarem a configuração das turmas. Por isso, as crianças podem ter medo de perder seus amigos ou ficarem sozinhas em uma classe desconhecida.
  • Maior quantidade de professores por disciplina: Nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, as crianças costumam ter poucos professores. A partir do 6º ano, essa dinâmica muda, e os alunos podem ficar receosos por haver mais professores e disciplinas e, consequentemente, mais trabalhos e provas. Isso também acontece no Ensino Médio, quando a disciplina de Ciências é dividida em Química, Física e Biologia, além do desmembramento de outras matérias, por exemplo.
  • Apreensão por terem mais responsabilidades: Nos Anos Finais do Ensino Fundamental, os alunos são mais cobrados do que nos anos anteriores — a estudar sozinhos, montar um calendário ou anotar os conteúdos no caderno por conta própria. No Ensino Médio, as exigências se intensificam frente ao vestibular e à escolha profissional. Assim, os estudantes podem ficar confusos e inseguros quanto à própria capacidade de lidar com as novas responsabilidades.

Como auxiliar as crianças e jovens no encerramento dos ciclos acadêmicos?

Os adultos desempenham um papel importante na superação dessas dificuldades, e contar com a presença e o apoio dos pais é fundamental para lidar com os desafios inerentes ao crescimento. “Conversar é sempre um excelente remédio”, afirma Fabiana. “Quando pais e educadores se colocam na posição de ‘bons ouvintes’, geralmente conseguem captar as inseguranças das crianças e adolescentes”. A escuta empática pode ajudar a transmitir a segurança que o estudante precisa para se expressar.

A importância desse apoio foi evidenciada nos números do Pisa 2015, exame internacional da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que avalia estudantes de 15 anos de cerca de 70 países. Segundo os dados, os jovens que relataram ter pais que se interessam por sua vida escolar tiveram um desempenho melhor na matéria de Ciências (414,08 contra 357,19 pontos), o que equivale a uma diferença de quase dois anos de estudo.

Além das famílias, a maneira como as instituições de ensino conduzem esse processo também é fundamental. Um dos pontos levantados pela especialista é o estímulo às atitudes intencionais dos próprios colegas. “A escola precisa preparar um ambiente acolhedor para os estudantes em transição. Uma das práticas do Programa Líder em Mim que pode ser replicada é a Conta Bancária Emocional, que é uma maneira de acolher, por meio da empatia, essas crianças e jovens”.

Nessa atividade, os alunos são incentivados a fazer o que chamamos de depósitos na conta bancária emocional de seus colegas, que por sua vez depositam na deles, por meio de atitudes positivas e amigáveis, recados, desenhos, mensagens e tudo o que entendem que pode fazer a diferença positivamente para o outro. Além disso, são estimulados a pensar o que seria uma retirada em sua vida e na vida de seus colegas, e evitá-las. Essas retiradas podem ser causadas por atitudes negativas, agressões ou falta de reconhecimento. “Os alunos do 1° ano, por exemplo, podem enviar recadinhos e desenhos contando como foi a experiência de quando chegaram nessa série para as crianças que estão finalizando o ciclo anterior, e assim por diante, de acordo com as idades e séries, em cada momento de mudança de ciclo”, sugere Fabiana.

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